Não há aquele que consiga ser de total compaixão alheia. A não ser um monge, como o do livro de auto-ajuda enrustido “O Monge e o Executivo”, que abre mão até de um emprego para ser solidário. Há aquele que ajuda o flanelinha no estacionamento, a senhora no supermercado, mas numa entrevista de emprego é capaz de dizer a sala errada para um possível concorrente. Apóiam greves, movimentos, revoluções, mas se instituírem uma divisão de renda entre a população, esse ou aquele ficarão com o pé atrás com relação a participar. Aquele que vive uma luta diária em busca de uma ocupação remunerada digna a sua família não gira o mundo atrás de uma comunidade que dista, não só dos grandes centros, mas também da sociedade padrão e bem alimentada. O fotógrafo, jornalista, humanista, mochileiro que se aventura em busca de pessoas necessitadas, no mínimo têm uma boa condição financeira na bagagem. Mas, pelo menos ajudam, não sendo estes atos altruístas, porque a divulgação desses trabalhos bonzinhos rende boas notas com valor.
Se reconhecer como indivíduo perante toda a sociedade não é mal algum. Uma vida enclausurada não seria nada digna e é sempre bom agradar a si mesmo, seja com um luxo de uma roupa na loja mais próxima, um banho quente mais demorado, um exagero semanal com um grande prato de comida que alimentaria três pessoas. Talvez até acender todas as luzes de casa sem necessidade porque, afinal, quem paga é você, ou então gastar uns dez copos no trabalho por estar insatisfeito com o salário. Não faria mal ignorar aquele chato colega porque ele tem algum problema e você não, ou sair com o troco a mais da padaria se achando o sortudo e não o corrupto. Seria uma auto-afirmação do eu interior, certo? Claro que sim, afinal o único certo no mundo todo é você!
Esse assunto não interessa a muitos, nem mesmo a alguns que escrevem sobre isso. Tema este embutido em outros temas, explicado em alguns e que serve como base para certos assuntos. Se uns poucos tratassem, mesmo que contrariando grandes pensadores, a individualidade como individualismo e assumindo então isso ser uma doença para a sociedade-caos do século XXI, talvez os dependentes práticos desse conceito largassem um pouco o vício da competição. Ou então que se jogue tudo para o ar em prol do bom e velho encosto nos outros. Pelo menos, assim, você vai precisar de alguém, mesmo que desconhecido, para alguma coisa.
Célia Pinheiro
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